Dionísio Jacob: "A Arte possui tantas dimensões que é difícil capturar sua essência... "
Dionísio Jacob cresceu cercado por livros que os pais liam e adaptavam para os teleteatros. Na adolescência apaixonou-se pela pintura e pelo desenho o levando a cursar Faculdade de Artes Plásticas. Fez diversas exposições e ilustrou inúmeros livros. Hoje em dia também escreve, conseguindo combinar perfeitamente bem atividades em artes e literatura. É um autêntico contador de histórias, seja por palavras ou plasticamente, mas também aquele tipo de artista que consegue fazer de tudo e tudo muito bem, exatamente por que faz tudo com muito amor.
A DOMI Galeria de Arte Online conversou com ele alguns anos atrás e agora, novamente, esse mês, o artista contou mais sobre sua carreira e projetos… confira abaixo:
Sabemos que você é um artista extremamente versátil e multitalentos, mas em suas próprias palavras, quem é Dionísio Jacob?
Bem, desde que me conheço por gente sou uma pessoa voltada para o universo artístico, para o mundo das artes, até por influência familiar antes mesmo da formação profissional. Tive um crescimento numa época extremamente experimental que foram os anos 60 e 70 e num ambiente multifacetado que me influenciou bastante. Para simplificar, poderia dizer resumidamente que sempre quis ser, fui e continuo sendo... um artista.
Como a Arte entrou em sua vida?
Meus pais eram artistas, gente ligada ao teatro, ao cinema e ao início mesmo da televisão no Brasil. Naquele começo, eles não apenas atuavam como atores e diretores dos teleteatros, mas precisavam adaptar textos para a mídia nascente. De modo que minha primeira grande influência foi literária. Cresci cercado de livros e fui um leitor precoce. Sempre gostei muito de escrever. Mas além dos romances, novelas e contos, eles compravam livros sobre História da Arte, sobre os grandes pintores, que me interessavam demais. Comecei a desenhar e pintar e passei a frequentar um curso de pintura para adolescentes que havia na FAAP, no fim dos anos 60, onde acabei encontrando o pessoal que depois viria a se tornar o Pod Minoga, grupo artístico multilinguístico que teve uma atuação marcante na década de 70.
Por que escolheu esse tipo de arte como forma de se expressar?
Por conta da formação nesse universo bastante diversificado sempre fiz, desde adolescente, o que faço até os dias de hoje: escrever e pintar. Claro que essas atividades passaram a continuam a passar por diversas fases, evoluções e aprofundamentos, mas basicamente são as duas atitudes artísticas que moldaram desde sempre a minha vida.
Fale um pouco sobre seus mestres, suas influências e inspirações. O que te move?
Já naquele supracitado curso de pintura que fiz na FAAP, havia aulas paralelas de teatro com Naum Alves de Souza, que depois viria a se tornar o líder do grupo Pod Minoga. Naum, grande dramaturgo e diretor de teatro, era também pintor, desenhista e cenógrafo. Foi ele quem fez os bonecos da primeira versão do Vila Sésamo no Brasil e o cenário do Falso Brilhante, musical icônico com Elis Regina. De modo que o Studio Pod Minoga, teve uma influência decisiva desse seu jeito multifuncional. Fazíamos de tudo: exposições de arte, decorações de vitrines de lojas, daqueles Cafés que começavam a tomar conta da cidade, além, é claro, das peças de teatro onde atuávamos como atores, cenógrafos, figurinistas e roteiristas. Foi um período muito criativo e de muito aprendizado, pois além da atividade no Pod Minoga (que pode ser vista no livro publicado pelo SESC sobre aquele trabalho), eu cursava a Faculdade de Artes Plásticas da FAAP, numa época de ótimos artistas e professores como Evandro Carlos Jardim, Regina Silveira, Júlio Plaza, Tomoshigue Kusuno, Nelson Leirner e Mário Ishikawa, de quem fui monitor nas suas excelentes aulas de Desenho Analítico. Também trabalhei como assistente do pintor e gravador José Guyer Salles em seu estúdio de gravura em metal, onde aprendi muito com a sua imensa cultura visual.
Um artista geralmente passa por diversas fases ao longo de sua carreira.. Como você definiria o seu trabalho hoje?
Tenho desenvolvido uma série de trabalhos que chamo de GRAVADOS DIGITAIS. Como o nome diz são feitos com computador, em programas digitais como Photoshop, Corel Painter, entre outros. Venho de uma formação inteiramente analógica e pertenço àquelas gerações que tiveram de “correr atrás”, com a chegada do universo digital. Também sempre preferi, nas artes visuais, as expressões bidimensionais às tridimensionais, como escultura, modelagem, etc. Desde adolescente era apaixonado por pintura, desenho, gravura, de fundo figurativo. Acho que a tela de um computador é uma extensão da folha de papel com suas características óbvias, como o brilho e o modo de cor RGB, entre outras. Ainda assim, trata-se de um prosseguimento dessa eterna expressão bidimensional tão atrativa para a imaginação humana e que já cobriu paredes de cavernas pré-históricas, de templos e palácios na forma de murais, continua cobrindo fachadas de edifícios modernos na forma de grafite, sem falar de papiros e papéis, livros e iluminuras, jornais e revistas, além das telas de pintura, é claro. Continuo pintando em acrílico, mas tenho explorado bastante as possibilidades expressivas dessa vertente digital.
Nos conte um pouco sobre o seu processo de criação, como ele funciona e como vc lida com ele?
No caso específico dos GRAVADOS DIGITAIS, tudo começa com um desenho que pode ser a lápis ou a nanquim. Desde a época da faculdade tenho o hábito de preencher blocos e blocos de desenhos, com a imaginação agindo livremente sobre o branco do papel, um traço puxando o outro, uma figura sugerindo um fundo, deixando, enfim, fluir a invenção. Ainda tenho até hoje esses blocos e costumo vez ou outra digitalizar esses trabalhos e até usá-los, pois os temas são atemporais. Uma vez tendo um desenho que me agrada, escaneio, transfiro para uma pasta no computador e passo a elaborar a cor e todo o acabamento final nesses programas a que me referi, através de superposições de imagens, de diversos filtros e toda uma técnica que fui elaborando com o tempo. Também gosto de misturar desenhos com fotografias que eu mesmo tiro.
Essa não é uma pergunta fácil de ser respondida, tamanho a sua complexidade, mas de forma resumida, o que é Arte para você?
A Arte possui tantas dimensões que é difícil capturar sua essência sem se perder num mar de subjetividade. Mas ela acompanha pontualmente toda a evolução histórica humana e responde com absoluta certeza a uma necessidade muito profunda de expressão da nossa alma, claro, sempre adaptando-se aos tempos e às culturas. E essa necessidade, para mim, vai além de qualquer utilidade prática que se possa dar à Arte e que são variadas. Digo isso sem negar que ela possa ter essas utilidades também. Contudo, a necessidade íntima de expressão toca em algo profundo da nossa psique e transcende alguns objetivos mais imediatos criados por uma época e sem utilidade em outra, pois toda criação do espírito humano permanece como uma aquisição legítima. Afinal, não é preciso ter nascido na Idade Média, nem ser necessariamente religioso para admirar a imensa beleza de uma catedral gótica e das obras que ela abriga.
Como foi seu caminho para chegar até aqui? Quais foram ou ainda são seus grandes desafios para trabalhar e viver da Arte aqui no Brasil?
Foi exatamente esse trajeto que comecei a trilhar na adolescência, nos cursos que fiz, nos trabalhos que realizei tanto em grupo como sozinho, lendo muito, vendo muito, estudando técnicas, exercendo a curiosidade estética sempre, buscando conseguir alcançar a melhor forma de expressar essa vida interna de onde surge sempre qualquer expressão artística. Os desafios de viver num país em constante crise política são muitos e é preciso resiliência. Atravessei até aqui diversos períodos históricos: minha juventude foi toda durante uma ditadura militar, quando as expressões culturais eram sempre vistas com desconfiança. Mas mesmo depois atravessamos tantas crises políticas, tantos problemas econômicos (e ainda estamos atravessando). Mas é preciso seguir sempre em frente, procurando exercer o trabalho que mais nos justifica, lutando pela liberdade da nossa consciência criativa.
Se você tivesse a oportunidade de orientar alguém que está apenas começando a dar os primeiros passos como artista, quais seriam as suas dicas?
Repetiria muitas das palavras da resposta anterior: aprender, fazer cursos, ler de tudo, assistir de tudo, respirar o ar do universo cultural em que se está inserido. Mas acima de tudo, não perder o contato com a vida íntima, com aquela intuição que temos de uma expressão pessoal, algo que seja nosso, que venha lá de dentro e que confira sinceridade ao nosso projeto artístico.
Nos fale um pouco sobre seus planos para o futuro... onde mais vc gostaria de chegar?
Anos atrás (talvez décadas), não fazia a menor ideia de que iria trabalhar numa forma de expressão digital, pelo simples fato de que essa possibilidade nem existia. E se faço isso hoje em dia é porque não perdi minha curiosidade pelas coisas que acontecem à minha volta. É preciso manter sempre nossa vivacidade interna, não perder a sensibilidade de perceber tudo com um olhar infantil — não no sentido de uma puerilidade ou irresponsabilidade, mas daquele frescor que é o dínamo da vida criativa. Portanto, pretendo ir até onde essa vida criativa me levar através das imagens e das palavras.
Para conhecer um pouco mais o trabalho do artista, visite aqui!!
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